7 a 1

                Tarde com brisas tristonhas. Iam-se embora os apitos e buzinas animadas, que antes demonstravam a animação e expectativa, esta agora perdida com o placar de 7 a 1. "Vergonha!" "Foi comprado! Juiz ladrão!" Era a expressão de todo torcedor brasileiro a cada gol que tomava da Alemanha. Torcedores coléricos prometiam vingança aos responsáveis pela feia derrota, fossem os oponentes ou mesmo os jogadores da Pátria Amada.

               Passara o jogo, pessoas deprimiam e exageravam no beber. Bebiam para afogar as mágoas do jogo humilhante, não sendo esse, porém, o único motivo. Mascaravam-se angústias, desafetos e fracassos com a desculpa de um jogo perdido. Empanturravam-se de churrasco, pipoca e cerveja. Barriga cheia, comida até o teto do estômago e a constante necessidade de continuar a incessante ceia. Alguns em condições mais sérias apelavam para substâncias mais anestesiadoras. Quanta dor! A cada gole, cada tragada, apertavam-se mais as preocupações num canto qualquer, a fim de serem esquecidas, pelo menos por alguns momentos.

               A derrota por 7 a 1 despertara muita braveza àqueles agora cheios de comida. O paiol estufado proporcionava moleza, dificuldade de manterem-se de pé. Afundavam-se, então, nos sofás e camas. Rendiam-se muitos tantos ao tardo sono para esquecer desapontamentos, entre outras desolações. Não importava mais qual dia era, ou qual seria o dia de amanhã. Se era dia de trabalho ou não, não era importante. A necessidade de deslembrar era constante.

               Havia alguns, contudo, que se negavam a entregar-se ao sono, muito embora estivessem na mesma situação de desesperança. Preferiam continuar o culto ao terreno, com direito a todos os atavios disponíveis. Mulheres, bebidas, outros entorpecentes, música, luz... festa. Desde os menos abastados aos milionários do Brasil, eram esses entregues aos requintes a eles disponíveis. Tudo em nome do prazer, fosse este para esquecer da derrota ou continuar seu papel de preencher negras lacunas do íntimo humano. Quiçá os dois.

               Naquela competição de ostentações, cada um, à sua maneira, procurava mostrar posses e capacidades. Dentre o sentimento comum de revolta, pairava no ar, de um olho ao outro, de um pensamento a outro, o anelo inquietante de fruir o que era de outrem, pois este sempre terá mais e melhor coisa. Carros e bebidas melhores, casa maior... A grama mais verde! O que fosse, é muito, e do muito todos queriam.
              
               Junto desse jogo intenso, normalmente, a vanglória é intensa. Aquele que mais tem quer exibir seu poderio material, até mesmo para se convencer de que não é apenas mais um simples naco de carne neste mundo imenso. O esforço para manter-se convicto de si é intenso e requer muita energia. Evitam dar o necessário ao que nada possui a fim de evitar gastos e acumular mais riquezas para mostrá-las ao outro.
              
               Uma derrota inesperada da seleção, que agora trazia à tona o patriotismo brasileiro. Trazia, também, à superfície, as incertezas e moléstias da humanidade. Chagas expostas, escancaradas aos que tivessem olhos de ver. Creem os pessimistas que são vícios incuráveis, perpétuos e inerentes à raça humana. Esperam, porém, os otimistas, a obliteração dos padecimentos coletivos em prol de um único e soberano sentimento edificante.





 ...E o amor, um dia, há de reinar.

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