Uma breve explanação de condições
atuais e importantes ao ser humano
Destaca-se a era atual pelos
avanços no campo da informação, pela rapidez e abrangência de seus meios. O
mundo nunca esteve tão conectado e tão pequeno: ao mesmo tempo em que um
acontecimento se desenrola em um país, o outro lado do globo acompanha em tempo
real; familiares e amigos trocam palavras escritas, falas e imagens uns com os
outros independente da distância a qual os separa. Nas palavras de David
Harvey, "o mundo encolheu." Parece-nos, contudo, que, apesar de
toda essa proximidade, essa tecnologia nos serve de forma desigual ao dar
ênfase, principalmente, à notificação de fatos negativos ocorridos ao redor do
planeta.
Os noticiários tornaram-se
abutres: divulgam todos os tipos de tragédias - se possível, em tempo real -,
fatos que expõem o lado negro do ser humano e dedicam a isso longos minutos de
um programa mórbido e sangrento. E de forma inteligente, deixam míseros
segundos para uma chamada alegre, um momento de emersão do poço ensanguentado
antes dos comerciais, o momento da apelação ao consumismo. Afinal, para uma
mente aliviada das carnificinas, tudo fica mais comprável e vendável. E assim o
sistema renova seu ciclo mais e mais vezes... Sempre dá certo, não precisa de
modificações.
Há quem insista em repetir a
conhecida frase "a cada dia que passa, o homem fica mais perverso e a
maldade domina o mundo!" Engano de quem assim pense, do contrário,
estaríamos nadando contra uma correnteza invencível, o que não é o caso.
Sabemos que tudo se origina de um só, infinitamente justo e bom; por ser o
Criador perfeito, de modo lógico, a criação deve dirigir-se à perfeição, do
contrário, Deus seria cruel por criar e apresentar às suas criaturas apenas o
sofrimento e a dor infindáveis. Assim, pelo fato de ainda sermos defectíveis,
rumar à perfeição é futuro certo. E se algo cursa ao Bem, não pode estar
"cada dia pior", logicamente. Atentemo-nos: se tenho olhos apenas ao
preto e branco, como poderei dizer a outra pessoa que, ao meu redor, tudo é
colorido? O mesmo se passa com os veículos midiáticos: são olhos direcionados à
dor, morbidez, injustiça e outras tantas mazelas por hora inerentes ao ser humano.
Se fazemos dos nossos olhos a má mídia, é inevitável pensarmos que o mundo só
apresenta as desgraças veiculadas e que, em algum lugar muito distante de nós,
há o bem. Este tão minúsculo e desbotado que não merece a atenção das câmeras
e, portanto, nossa atenção. Dessa maneira, não há como o mundo ser colorido...
O algoz, todavia, não é somente
a tela que nos prende. O ditado "só há circo pois há aplausos" resume
perfeitamente tal situação. Somos a causa primária do problema: o ser humano
possui, por infeliz natureza, uma atração pelo que é mórbido. Sabendo disso,
não há outra alternativa para quem deseja vender seu produto senão alimentar o
monstro dentro de cada um de nós. Os jornais não nos forçam a ver as tragédias,
apenas nos saciam essa doente atração pela calamidade alheia - porque quando é
conosco, a coisa muda. E todo o ciclo continua...
Agora, enxerguemos outro problema
conseguinte. Além dos nossos próprios sofreres, deparamo-nos com todos os
corações dilacerados pelos revezes da vida. O mais comum movimento para não
perecermos diante disso é nos distanciarmos: ficamos alheios a todo e qualquer
tipo de sofrimento. Assim é mais fácil viver, pelo fato de não precisarmos
compadecer do irmão cujo coração urra de dor ao nosso lado. Porém quem disse o
comportamento fácil ser ideal ao crescimento? Essa insensibilidade, perda da
capacidade de sentir empatia está longe de trazer-nos a felicidade, o que nos
leva a mais um importante ponto.
Ouve-se que a geração nascida no
século XXI é a geração do "deboísmo", do "estar de
boa" com tudo; não condena nem adere ao que não lhe agrada, mas tolera e
convive; independente de como o outro seja, isso é problema dele. Ao mesmo
tempo, declara-se, categoricamente, que essa geração é a geração do
individualismo: o sujeito pensa em si e como ele será bem sucedido na vida.
Contraditório, não? Então quem está certo? Não se admite as duas afirmações
haja vista serem antagônicas e não nos cabe aqui dizer que faz parte das
contradições humanas. Proponho uma reflexão: será mesmo que os problemas do
outro não devem interferir de maneira alguma em nossas vidas? É tão fácil assim
sequer pensar na dor ao nosso lado?
Embora, em muitos corações, haja
tolerância e respeito, é fato que a maioria dos indivíduos apresenta,
infelizmente, os sintomas da indiferença. Diz-se que se respeita a decisão ou
estado religiosos, partidários, sexuais do outro, mas a questão é que não se
despendem tempo ou esforços para pensar na condição do semelhante. E viver no
próprio mundo, a ignorar tudo e todos ao redor, é muito confortável, porém
extremamente egoístico. Não tratamos aqui das intervenções e opiniões
maledicentes e corriqueiras, mas do altruísmo que tanto está contido no
vocabulário das pessoas e pouco se pratica.
Como um novelo de lã se desfazendo,
surge outro nó a ser desatado. Exige-se das pessoas a tolerância pelo
diferente: o famoso "não precisa gostar, mas não ofenda". Acho que
passamos da fase de necessitar apenas disso. Para a criança, dizemos para não
ferir o colega por ele ser diferente e ponto. "Não bata no amigo porque
faz dodói." Não há como dar muitas explicações de alguns porquês ainda,
mas ensina-se a contenção de qualquer atitude hostil. Todavia a maturidade
exige ir adiante: nutrir esforços para, além de tolerar, passar a respeitar o
que não é igual a nós. E claro, a fim de alcançar essa etapa, é necessário
entender a posição do outro e, de modo lógico, colocar-se no lugar dele. Isso é
maturidade, creio já estarmos em condições de "praticá-la".
São tantas as chagas no íntimo humano que, sem a consciência, não haveria chances de curá-las. Felizmente, temos essa companheira inseparável, a qual nos cobra e ensina diante das vicissitudes da vida. Embora anestesiada pelas barbáries particulares e gerais, é facilmente despertada por um gesto bom ou um sentimento de boa vontade, afinal, ela é a lei divina dentro de nós. Por mais que os grandes holofotes estejam direcionados às atrocidades, a ofuscar as benditas capacidades humanas, não se deve desistir... A possibilidade da mudança não é casual, e sim certa. Joan Riviere, psicanalista inglesa, traz-nos, de modo sábio, que nossa paz mental depende de nossa preponderância do bem sobre o mal a qual todos buscamos. Para esse fim, saibamos o poder da união com a frase cujo real autor desconheço: nenhum de nós é tão bom quanto todos nós juntos. Tal juntar-se significa abrir mão do egoísmo e vaidade, passo importante para a madurez moral. Sem esta, não há como ser feliz, visto que nos dá ferramentas benditas para transmutar o mal em frutos benéficos, doces como só a felicidade o é.
Não vos desespereis! Não permitais que o desencanto abra feridas no âmago do Ser. Tende bom ânimo e confiai nAquele que é a vida das nossas vidas.
Bezerra de Menezes
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